Faltam carregadores de piano
I
O modelo presidencialista do Sport Lisboa e Benfica, tem de ser revisto.
Tem várias virtudes, quiçá a mais importante é a de ser uma das formas possíveis da democracia.
O problema está quando a pool candidatos a Presidente do SLB, não reúne qualidade suficiente.
E por qualidade, denoto capacidade na gestão desportiva e económica do Clube. São demasiadas exigências para um indivíduo só, especialmente se não é uma pessoa que delegue, isto é, que se faça rodear de outros mais competentes para cumprimento das missões. Basta que a escolha recaia mais no factor da troca de favores, confiança política ou para calar a oposição, e o Clube deixa de cumprir efectivamente os objectivos a que se propõe.
Assim, o Benfica fica demasiado dependente da figura do Presidente. Passa a estar condicionado e à sua imagem.
Só para citar exemplos recentes, o Benfica pato bravo de Luís Filipe Vieira, e o Benfica das vedetas de Rui Costa.
Pato bravo porque foi um Benfica deslumbrado, com a influência e dinheiro do BES disponível.
O Benfica do betão, que era necessário, mas também o Benfica que acabou por se tornar no carrossel de jogadores, e coisa anexada por Jorge Mendes.
A finalidade desportiva foi secundarizada, com os resultados que todos conhecemos.
O Benfica de Rui Costa, começa a parecer-se também com o presidente em função.
Rui Costa teve, felizmente, uma boa formação. Teve uma vida familiar normal, sem acontecimentos traumáticos que lhe toldassem a personalidade. Vemos isso quando olhamos para ele. Parece ser boa pessoa, e alguém a quem eu convidaria para uma mini com tremoços, não fosse ele recusar por preferir Don Perignon com ovas de esturjão.
O futebolista não é um empresário habituado a competir no mundo de cão dos negócios, nem alguém cujo propósito de vida foi ser presidente do seu clube. O futebolista moderno é um mercenário, bem pago e apaparicado de forma louca, pelos adeptos que sobrevalorizam o futebol por vezes acima das questões políticas, ideológicas ou ambientais que a sua era lhes oferece.
Tudo isto para dizer que ter um presidente futebolista, equilibrado, mas também habituado a estar afastado da realidade, pode nem sempre ser uma coisa boa.
Rui Costa parece-me ser alguém desprovido do sentido agónico da vida.
Da ideia de que é tudo uma competição, uma luta sem quartel, e que, parafraseando Voltaire, é preciso ter o diabo no corpo para vencer no quer que seja.
Porque gostamos de Gilberto? Porque não se conforma com as suas limitações e prefere morrer em campo para cumprir a sua missão. O jogador do Benfica sempre foi assim.
Sempre.
Sempre teve jogadores carregadores de piano, cuja qualidade foi sempre aumentando ao longo das fases evolutivas do Clube.
Claro que um clube tem de ter uma sábia mistura de carregadores de piano e craques, craques que fazem a diferença, carregadores de piano que fazem as vitórias.
Olhando para as contratações, com a incógnita de Ristic, não contratámos nenhum carregador de piano de qualidade.
O carregador de piano é o mais estável tipo de jogador, a sua maior virtude é mesmo o esforço contínuo, que com o tempo o faz melhorar. O grande último carregador de piano, foi Veloso, para mim. Foi Schwartz, mas também Javi Garcia, Matic, mesmo Eliseu.
O carregador de piano é também, ou pode ser, um grande jogador. Mas não é um craque, não é um Chalana, um Eusébio, um Vítor Baptista.
Nesta dualidade está a chave dos sucessos do Glorioso, coisa que parecem todos ter esquecido, aquando da definição de perfil psicológico para contratação de jogadores.
Rui Costa tende naturalmente para o lado das vedetas, dos craques. O mesmo Rui Costa que treinou com Veloso, o Rui Costa que percebeu em Milão, que ser um craque é sempre relativo, pois há sempre um Káká em algum lado do mundo.
https://arquivos.rtp.pt/conteudos/stefan-schwartz-desmente-transferencia/
O jogador do SLB tem de comer a relva, por causa dessa exigência interna, que já mencionámos várias vezes aqui no blogue. Não é dizer nas redes sociais ou para as objectivas. É em campo.
Isto é um velho sofisma, quem sempre teve tudo, tem dificuldades em desejar muito algo, e fazer tudo para o conseguir.
Como clube popular, o Benfica sempre apreciou este tipo de jogadores que se deixaram transmutar pela honra de poder jogar no Clube. No Benfica não se criticava a falta de habilidade, mas a capacidade trágica e poética do próprio indivíduo se sacrificar em nome de um ideal de nome Sport Lisboa e Benfica.
Temo que Rui Costa, amolecido por anos de conforto material, não seja a pessoa com fibra que precisamos à frente do Clube. Especialmente se não se soube rodear das pessoas certas. E direi o mesmo se daqui a um ano estiver a chorar de felicidade no Marquês ou nos Aliados. Há um paradigma de jogadores que quero no SLB, e não me cansarei de o exigir.
Claro que Weigl, Grimaldo, não constam desse lote. Nada contra os jogadores.
Mas quebram efusividade nos outros.
São como aqueles amigos que temos, que numa noite de engate só sabem espantar as cachopas contando histórias sobre bichos da seda.
É preciso gente de fibra não aburguesada. E carregadores de piano, que sabem reconhecer, que não há nada mais alto que jogar de Águia ao peito. Porque não há.
II
Prometi-me dar um ano de benefício da dúvida a Rui Costa.
A fazer fé na notícia do Diário de Notícias de hoje, Jota e Gedson, foram vendidos com cláusula de recompra.
Relembro que ambos foram enxotados pelo anterior presidente, a soldo de uma estratégia de 'ganhar rápido'.
Se é verdade que esta direcção, responsável pela venda, fez isso, ou seja, se é possível corrigir a injustiça e a incompreensível alienação de valor desportivo, devo dar os meus parabéns, e agradecer ao presidente que acabei de criticar.
Jota e Gedson, deviam ter tido uma oportunidade neste plantel.
São posições que temos carenciadas.
Jota talvez tenha mostrado menos, mas foi mais bem queimado que Gedson.
Um e outro foram vítimas de má gestão desportiva por parte do Clube.
Curiosamente, tal como os irmãos Horta, Bernardo, Cancelo, e outros.
Se alguém comer ovas de esturjão com Rui Costa, relembrem que Ferro, também mereceria uma 2a oportunidade. Cometeu muita argolada, é certo, mas o seu primeiro ano, foi muito bom.
Como é que vamos sedimentar ADN Benfica, se vendemos ou expulsamos os jogadores que formamos?
Sim, nem todos têm qualidade para jogar no SLB. Sim, nem todos podem ficar.
Mas todos devem ter oportunidade para mostrar que se quiserem podem encher o coração dos adeptos na Luz, transmutando-se para carregadores de piano.
Até porque uma equipa faz-se com a mescla de jogadores diferentes, todos com importância. E os carregadores de piano são os que dão a estabilidade e segurança necessária para os outros produzirem o extra.
ResponderEliminarnem mais.Ãntigamente era possível contratar os bons jogadores em Portugal. Neste momento é quase impossível, ao SLB pede-se sempre demais por cada jogador.A aberração é que fica mais barato ir buscar ao Brasil ou Argentina.
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